Após um longo processo de discussão que envolveu diversas sociedades médicas, o Conselho Federal de Medicina (CFM) decidiu proibir a prescrição de esteroides androgênicos e anabolizantes com finalidade estética, ganho de massa muscular e melhora do desempenho esportivo. A regulamentação foi publicada no Diário Oficial da União no dia 11 de abril. A medida é considerada uma vitória para especialistas, já que muitos usuários aprestaram problemas graves de saúde após o uso desses anabolizantes, como infartos, Acidentes Vasculares Cerebrais (AVCs), insuficiência hepática, infertilidade, agressividade e, em alguns casos, até a morte.
“O indivíduo que usa anabolizantes pode ter complicações muitas vezes graves e até fatais. São efeitos colaterais no sistema nervoso central, tanto da parte neurológica como psiquiátrica, irritabilidade, agressividade, depressão, risco de suicídio, indivíduos predispostos podem desenvolver psicopatias com sintomas paranoicos e psicóticos. O cérebro diminui de volume. Esses indivíduos se tornam mais violentos, pois já existem estudos mostrando que o risco de cometer crimes violentos e até de prisão aumenta muito”, alerta o médico Dr Clayton Luiz Dornelles Macedo, professor com Doutorado em Endocrinologia Clínica pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).
Dr Clayton Luiz Dornelles Macedo, médico endocrinologista
Além disso, o especialista destaca que os indivíduos desenvolvem dependência, tanto física quanto psíquica. Sintomas cardíacos também são bastante prevalentes, muitas vezes fatais como casos de infarto e AVC em jovens. “Esses anabolizantes fazem aumentar a pressão arterial, baixam o bom colesterol (HDL) e aumentam o mau colesterol (LDL). Além de alterarem a glicose possibilitando o risco de diabetes, eles criam estado pró-trombótico, aumentam o risco da embolia e trombose e podem causar arritmias, aumento da gordura visceral e tudo isso faz com que esses indivíduos tenham mais risco de enfarto e derrame com morte prematura”, pontua.
Dr Clayton Luiz alerta que o uso desses anabolizantes também afetam o fígado, podendo desenvolver hepatite medicamentosa, insuficiência hepática, muitas vezes necessitando de transplante. “Tem risco aumentado de tumores de fígado, tanto benignos quanto malignos. Os rins também podem sofrer com lesão renal. Já existem trabalhos mostrando que os usuários de esteroides anabolizantes têm um perfil de se proteger menos durante o ato sexual. Além disso, o testículo atrofia, o homem adquire impotência, riscos de doenças da próstata, na mulher pode causar irregularidade menstrual, até falta de menstruação, infertilidade”, explica.
Diversas entidades médicas vêm trabalhando na elaboração dos itens da regulamentação. Apoiaram a decisão do CFM as Sociedades Brasileiras de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), Medicina do Esporte e do Exercício (SBMEE), Cardiologia (SBC), Urologia (SBU), Dermatologia (SBD), Geriatria e Gerontologia (SBGG) e pelas Federações Brasileiras de Gastroenterologia (FBG) e das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO).
Uso permitido
A Resolução do CFM pontua que o médico não pode prescrever para fins estéticos, esteróides anabolizantes e similares, hormônios que atuem com o anabolismo, principalmente derivados de testosterona, mas também hormônios do crescimento e outras classes. A prescrição se enquadra nos casos de hipogonadismo, diagnosticado por exames e com quadro clínico, para incongruência de gênero, também casos especiais de caquexia, síndrome do desejo sexual hipoativo.
Segundo especialista, a medida evitará problemas graves de saúde como infarto e AVC
“A prescrição deve seguir critérios, não é para qualquer mulher com diminuição da libido, e só deve ser usada testosterona depois de tratar todas as outras causas de diminuição da libido, que são a menopausa, a obesidade, depressão, uso de medicações, principalmente antidepressivos, sedentarismo, problemas conjugais, lesões ginecológicas que levam ao desconforto na relação sexual. Existe algumas situações clínicas bem definidas que o médico especialista não vai deixar de prescrever. A questão é o indivíduo jovem, a mulher, o homem de meia idade que está usando doses que são literalmente cavalares e de hormônios sem ter alguma deficiência e, muitas vezes, em combinação com outros produtos, com outras drogas que teoricamente seriam protetoras de efeitos colaterais, mas que aumentam ainda mais o risco”, comenta Dr Clayton Luiz.
Comércio paralelo
De acordo com o médico, um outro problema grave se originou a partir do mercado dos esteroides androgênicos e anabolizantes, que é o comércio de cursinhos de “fim de semana”, que a classe médica chama de cursinhos control C control V. Segundo ele, essas instituições absorvem, principalmente, médicos recém-formados. “São, normalmente, administrados por pseudo-especialistas que invadiram as redes sociais usando seu marketing para seduzir àqueles que se deslumbram com o sucesso mais imediato, consultórios mais cheios de pacientes que normalmente pagam valores bem elevados por consultas”, disse.