O princípio constitucional da vinculação ao instrumento convocatório não foi observado pela empresa contratada no decorrer das partidas, e faltou fiscalização da SEED

Realizados há 35 anos os Jogos da Primavera sempre foram tradicionais no estado. Somente na edição de 2018, segundo a Secretaria de Estado da Educação, do Esporte e da Saúde, cerca de cinco mil atletas de escolas públicas e privadas participaram do evento.

Essa busca dos alunos e colégios pelos jogos acontecem porque, por ser a seletiva estadual para os Jogos Escolares da Juventude e para as Paraolimpíadas Escolares, os Jogos da Primavera sempre foram vistos como uma grande oportunidade para aqueles que desejavam seguir carreira como atletas profissionais.

Mas em meio a tantos sonhos e ao árduo empenho de jovens atletas e seus técnicos, uma série de irregularidades constatadas, pelo menos na sua última edição, colocam em cheque o papel da antiga Secretaria de Estado da Educação, que hoje recebe o nome pomposo e um pouco desencontrado de Secretaria de Estado da Educação, do Esporte e da Saúde (Seduc).

Para a última edição da competição, realizada em 2018, a secretaria contratou, por meio de licitação realizada através dos conhecidos pregões eletrônicos, a empresa Barretos Eventos Produções e Turismo Eireli para prestar serviços de arbitragem e limpeza dos espaços físicos onde as competições foram realizadas. Esses contratos, pactuados entre a Secretaria e a empresa, totalizaram um valor de R$ 465,647.71.

Para facilitar o entendimento do leitor, é bom esclarecer que Eireli, ou Empresa Individual de Responsabilidade Limitada é uma categoria empresarial que permite a constituição de uma empresa com apenas um sócio, sendo este o próprio empresário.

No entanto, coordenadores e técnicos ouvidos pelo CINFORM afirmam que houve uma série de problemas com relação à arbitragem, relacionados com recursos que estavam previstos no edital, mas que não foram colocados à disposição nos espaços de competição. E, a equipe contratada para fazer a limpeza dos espaços não o fez na maioria dos dias. São tantas as irregularidades que algumas escolas particulares deixaram de participar da tradicional competição e outras participaram apenas por se tratar da seletiva estadual para a principal competição estudantil do país.

“Se não fosse uma seletiva, provavelmente muitos repensariam se vale a pena participar dos Jogos da Primavera. Como coordenador ouvi muitas reclamações dos professores de diversas modalidades com relação à arbitragem e espaço inadequado para a competição”, comenta um coordenador de esporte de uma escola da capital que prefere não ser identificado.

PROBLEMAS NA ARBITRAGEM
No edital que trata sobre a contratação da empresa responsável pela prestação do serviço de arbitragem era apontado, no item h inciso 4 – das “obrigações da empresa contratada” – que esta deveria contratar dois árbitros de quadra e três mesários para as partidas do basquete, já que isso é o esperado para condução tranquila de uma partida com todos os seus imprevistos, aliás, uma prática corriqueira em todo o país.

No entanto, em uma das súmulas da segunda etapa da competição, à qual o CINFORM teve acesso, pode-se perceber que a cronometrista e a operadora de 24” eram a mesma pessoa: Carla Regina de Carvalho Leite, árbitra contratada através da Associação dos Árbitros dos Esportes Coletivos e Individuais do Estado da Bahia. Além do uso ilegal do papel timbrada da Confederação Brasileira de Basquete (CBB).

Súmula mostra que uma mesária ocupava duas funções na partida e o papel timbrado da CBB

No desenrolar de uma partida de Basketball, em qualquer lugar do mundo, a mesa é obrigatoriamente composta de um marcador auxiliar, um marcador principal, um cronometrista e um operador do relógio dos 24 segundos, que é o tempo que cada equipe tem para finalizar um ataque, sendo necessário um operador exclusivo para controlar.

O problema, aparentemente simples dessa alteração está em contrariar o princípio da vinculação ao instrumento convocatório (o edital), afrontando princípio basilar da Lei Geral das Licitações, deslize da contratada que poderia facilmente ser detectado pela Secretaria, que tem obrigação legal de fiscalizar a execução do contrato.

Segundo a Confederação Brasileira de Basquete, “nenhuma competição regional de basquete poderá ser realizada e nenhum árbitro de basquete poderá atuar nas competições regionais de basquete sem a permissão da Federação de Basquete estadual correspondente e da Confederação Brasileira de Basquetebol”. No entanto, a Barretos Eventos contratou uma associação baiana de árbitros para desempenhar tal atividade.

Essa postura, por si, já denota uma despreocupação da empresa contratada para com a obrigatoriedade de cumprir o que estava expresso no edital e na ordem de serviço que teria de ser emitida pelo contratante. Por outro lado, descumpriu regulamento da CBB que exige, no caso de jogos em Sergipe, árbitros permitidos pela associação local.

Procurado pela reportagem do CINFORM, o então presidente da Federação Baiana de Basquete, Roberto Fernandes, afirmou que não há qualquer árbitro da associação baiana que esteja filiado à Federação. Segundo Roberto, “eles apenas fizeram um curso de arbitragem na federação baiana e apitaram partidas somente durante o curso”.

Apesar de ter sido avisada diversas vezes sobre a ilegalidade da contratação da associação, a presidente do Comitê Organizador Estadual dos Jogos da Primavera, Maria Auxiliadora Almeida Pires Santos, afirmou em resposta a todos os ofícios encaminhados à organização do evento que tudo transcorria dentro da legalidade.

Na primeira fase dos Jogos da Primavera, que, na verdade foram os Jogos Escolares da TV Sergipe, a arbitragem foi feita e indicada pelas federações de cada modalidade, e tudo correu bem. No entanto, na segunda etapa, a SEED e/ou a empresa contratada para prestar este serviço optou por contratar Ligas e Associações para apitar as competições. O que gerou um grande incômodo para atletas e técnicos de diversas modalidades devido aos erros e à inexperiência dos árbitros contratados.

Um técnico de vôlei afirmou ao CINFORM que sua modalidade também foi prejudicada na etapa seletiva dos jogos. Segundo ele, “era muita gente sem experiência de jogo e sem saber o protocolo. Tanto os atletas quanto os professores ficaram muito chateados com a arbitragem da fase seletiva”.

Atletas e técnicos de diversas modalidades reclamaram da arbitragem dos Jogos da Primavera (Foto: Divulgação/Seed)

OUVINDO A SECRETARIA
Em resposta aos questionamentos do CINFORM a respeito das denúncias que o jornal recebeu a respeito da arbitragem e limpeza dos espaços a Secretaria de Estado da Educação, do Esporte e da Saúde (Seduc) informou que “as denúncias não procedem”.

“Mesmo assim, todos os processos são avaliados, até porque nas competições dos XXXV Jogos da Primavera houve a presença de técnicos gabaritados para tal função, ultimados por edital público da Secretaria de Estado do Planejamento, legitimado pela Procuradoria Geral do Estado, a fim de que se, porventura houvesse alguma falta de lisura no momento do jogo, estariam aptos a solicitarem a correção de imediato ou ingressarem com representação legal no Conselho de Justiça Desportiva (Conjud)”, comentou a secretaria por meio de nota.

O CINFORM tentou entrar em contato com o dono da empresa Barretos Eventos Produções e Turismo Eireli, Gilvan da Silva Barreto, para esclarecer as denúncias, mas até o fechamento desta reportagem não obteve sucesso.

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