Na última segunda-feira, 27/03, um jovem estudante entrou em uma sala de aula, esfaqueou a professora Elizabeth Tenreiro, 71 anos, pelas costas no momento em que fazia a chamada, matando-a. Não fosse outra professora, que lhe aplicou um mata-leão, muito provavelmente teríamos uma chacina consumada.
Em Maruim, no dia 29/03, um estudante falou para outro que tinha vontade de entrar na escola e matar as pessoas com uma arma. Felizmente, a direção da escola soube da conversa e tomou as devidas providências, anulando o possível ataque.
Estudo feito pelo Instituto de Estudos Avançados, da UNICAMP, constatou que, nos últimos anos, aumentou o número de casos de violência no interior das escolas. Em alguns casos, houve vítimas fatais. Ao todo, o levantamento identificou 22 ataques, sendo que nove aconteceram nos últimos doze meses.
Entre os fatores apontados pelos especialistas em violência na escola está o bullying, a cultura do ódio, crescimento de ideias nazifascistas entre os jovens com idade escolar, fácil acesso às armas, a intolerância, entre outros.
Por outro lado, esta situação talvez reflita um problema emocional que atinge parcela dos estudantes. Levantamento feito pelo DataFolha durante o mês passado, identificou que 40% dos estudantes, com idade entre 6 e 18 anos, precisam de algum tipo de apoio psicológico.
Como gosto de dizer, a escola que conhecemos atualmente é consequência direta da contribuição de alguns filósofos e filósofas, a exemplo de Lutero, Comenius, Condorcet, Mary Wolstonecraft.
Enquanto instituição, a escola é o espaço potencialmente capaz de garantir um dos principais direitos humanos a ponto de ser consagrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos, falo do direito à educação.
Da Revolução Francesa até os dias atuais, a escola passou por diversas transformações. Deixou de ser um espaço privilegiado para crianças brancas e ricas, para ser um aberto para todos e todas, de forma indistinta.
Paralelamente, a escola também tem sido o palco principal para a difusão do conhecimento, muito embora o avanço da tecnologia e as relações sociais tenham retirado um pouco este monopólio.
Todavia, a primeira grande crise da escola talvez tenha sido registrada com o advento do Capitalismo. Marx e Engels, na Ideologia alemã, identificaram que a divisão social do trabalho fez emergir dois tipos de trabalho; um intelectual e outro manual. Como consequência, filósofos e filósofas marxistas destacaram que haveria, portanto, dois tipos de escola: 1) Uma que preparava as crianças e jovens para os estudos propedêuticos e superiores; 2) Outra vocacionada para o mundo do trabalho.
Na esteira do marxismo, Louis Althusser chegou a caracterizar a escola como Aparelho Ideológico do Estado (AIE), por compreender que ela era um instrumento de propagação da ideologia burguesa.
A crítica mais radical a escola talvez tenha sido feita por Ivan Illich. No livro Educação sem escolas, o filósofo anarquista afirma que a escola se transformou em uma instituição burocrática, manipuladora e com um único propósito, reproduzir as relações econômicas que beneficiam o capital.
Ora, observa-se que, ao longo dos séculos, a escola foi objeto de crítica por parte de diversos filósofos e filósofas. Entretanto, em nenhum momento ela foi convertida em local para despejar o ódio, a violência, a morte.
Temos visto recentemente uma ação deliberada que nega a escola e sua condição de efetivar o direito à educação. Movimentos como Escola sem partido e dos pais que defendem a prática do homeschooling contribuíram, do ponto de vista conceitual, para a conversão da escola em inimiga da sociedade. Em conjunto, os dois movimentos criticam a escola e quem a constrói diariamente, especialmente os/as professores/as.
Em suma, os professores, que já sofrem críticas por não ofertarem uma educação de qualidade ou pelo simples fato de reivindicarem melhores salários e condições de trabalho, viraram alvo de uma campanha sórdida, agressiva e que tem causado vítimas fatais no interior das escolas. Nota-se, portanto, que a morte entrou na sala de aula, passando a sensação de que a crítica à escola se converteu em ódio contra a escola.
Prof. Dr. Christian Lindberg é graduado em Filosofia (UFS) e doutor em Filosofia da Educação (UNICAMP). Possui pós-doutorado em Educação pela UNICAMP. Faz parte do corpo docente do Departamento de Filosofia e do Programa de Pós-graduação em Filosofia da UFS. Coordena o Observatório do Ensino de Filosofia em Sergipe (OBSEFIS).
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