A antiga disputa territorial entre Venezuela e República da Guiana pela região conhecida por Essequibo sofreu uma escalada nos últimos dias, após o governo venezuelano intensificar a reivindicação pela área, conhecida por suas riquezas em ouro, diamantes e petróleo.

A região de Essequibo tem aproximadamente 160 mil quilômetros quadrados, pouco maior que o Estado do Ceará, e representa 70% do território guianês.

É uma região é rica em minerais como ouro, cobre, diamante e, recentemente, lá também foram descobertos enormes depósitos de petróleo e outros hidrocarbonetos.

Nicolás Maduro — Foto: Matias Delacroix/AP

A votação engendrada pelo presidente Nicolás Maduro na Venezuela, realizada no domingo (03/12) remonta uma disputa iniciada ainda durante o processo de independência das ex-colônias espanholas.

Em 1811, a Venezuela tornou-se independente, e a região de Essequibo passou a fazer parte do país. Três anos depois, porém, o Reino Unido comprou a então Guiana Inglesa por meio de um tratado com a Holanda. O tratado de compra, no entanto, não definiu com precisão qual seria a linha de fronteira do país com a Venezuela.

Em 1840, o Reino Unido nomeou o explorador Robert Shomburgk para definir essa fronteira, e uma linha, chamada Linha Schomburgk, foi estabelecida. Com ela, a então Guiana Inglesa passou a ter 80 mil quilômetros quadrados adicionais em relação ao território inicialmente adquirido da Holanda. Em 1841, começou oficialmente a disputa pelo território com denúncias sobre uma incursão indevida do Reino Unido no território.

Nas décadas seguintes, a controvérsia em torno de Essequibo passou a fazer parte da disputa por influência na América do Sul entre os Estados Unidos, uma potência em ascensão na época, e o então poderoso Império Britânico.

Os americanos expandiram seus interesses pela região e usavam como argumento a chamada Doutrina Monroe, cujo slogan era “América para americanos”. A postura representava, na prática, uma tentativa de limitar a influência das potências europeias sobre o continente.

Os britânicos apoiavam seu direito ao território com base no fato de que, em 1648, os espanhóis cederam toda a área a leste do Orinoco aos holandeses. Parte dessa terra foi posteriormente passada pela Holanda ao Reino Unido.

A Venezuela, por sua vez, afirma que o território pertence a ela, já que era parte do Império Espanhol, havia a presença de religiosos espanhóis na área e, segundo ela, os holandeses nunca ocuparam a região à oeste do rio Essequibo. A reivindicação existe mesmo antes de o país se tornar independente, ou seja, quando ainda era parte da Grã-Colômbia.

A região é conhecida na Venezuela como Guiana Essequiba, ou simplesmente, Essequibo, e aparece atualmente nos mapas oficiais do país como “Zona en Reclamación”, ou seja, um território que está sendo reivindicado.

Sob administração guianesa, Essequibo inclui áreas de seis províncias, das quais duas estão integralmente inseridas ali e três têm a maior parte de suas superfícies localizadas na região reivindicada pela Venezuela.

Além disso, Essequibo inclui uma porção importante da costa guianesa, onde há poucos anos foram descobertas enormes reservas de petróleo e que a Guiana já está explorando, em parceria com companhias como a norte-americana ExxonMobil e a chinesa CNOOC.

Em 1895, os Estados Unidos, então aliados da Venezuela, denunciaram a definição da fronteira e recomendaram que o caso fosse definido por meio de uma arbitragem internacional.

Três anos mais tarde, foi emitida a Sentença Arbitral de Paris, que decidiu de forma favorável ao Reino Unido.

Porém, em 1949, veio a público, o memorando de um advogado americano que atuou na defesa da Venezuela no processo de arbitragem em Paris. O documento denunciava uma suposta imparcialidade dos juízes do caso.

A divulgação desse documento e de outros arquivos do processo, passaram a ser usados pela Venezuela para pedir que a Sentença de Paris fosse considerada “nula e sem efeito”.

A Guiana solicitou que a Corte Internacional de Justiça, sediada em Haia, na Holanda, arbitre a disputa, mas o governo venezuelano vem, reiteradamente, negando a legitimidade da instituição para decidir o futuro de Essequibo.

Na sexta-feira (30/11), a Corte Internacional de Justiça expediu uma decisão sobre um pedido feito pela Guiana que solicitava que a corte impedisse a realização do referendo.

Recentemente, no último 24 de outubro de 2023, o presidente venezuelano declarou que o referendo daria, pela primeira vez, aos venezuelanos, os meios para tomar “uma decisão coletiva como país”. Outras declarações oficiais sugerem que a Venezuela está tomando medidas com vistas a adquirir o controle e administrar o território em disputa. Além disso, oficiais militares anunciaram que a Venezuela está a tomar medidas concretas para construir uma pista que sirva de “ponto de apoio logístico para o desenvolvimento integral do Essequibo”.

 

A Corte considera que, à luz da forte tensão que caracteriza atualmente as relações entre as partes, as circunstâncias acima mencionadas representam um sério risco de a Venezuela anexar e exercer o controle e a administração do território em disputa no presente caso”, diz a decisão da Corte.

O presidente guianês, Irfaan Ali, afirmou que a região de fronteira será reforçada pela polícia e forças armadas. O governo da Guiana considera que as medidas tomadas pela Venezuela, incluindo o plebiscito, são agressivas, infundadas e ilegais.

O governo dos Estados Unidos disse que pode rever a retirada de sanções à Venezuela caso o país realize ações contra o país vizinho. E o Brasil defende uma solução pacífica para o conflito.

Tirem suas próprias conclusões.

 

 

Por: Ermerson Porto – Historiador

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