Antes de abrir a boca pra falar isso, vamos discutir sobre o assunto

Você pode nunca ter ouvido isso, mas no meio gastronômico essa frase é mais propalada que bom dia em grupo de família em Whats app. Carnes assadas além do ponto, sushis pintados de cream cheese, risotos que mais parecem sopa de arroz passam como bons e tem feito profissionais da área tristes, deprimidos.

Mas peraí: é o sergipano que não tá sabendo comer ou tem muito chef aí sem saber cozinhar?

Lúcio Mauro

“Ontem vi uma senhora devolver uma suculenta costela suína que havia ficado duas horas no forno dizendo que estava crua”, revelou o chef Lúcio Mauro. “Saber comer é muito subjetivo, a cultura deve ser respeitada”.

Mas se a afirmação que dá título a essa matéria for verdade, de quem é a culpa por essa, digamos, educação deficiente: do cliente, do chef ou do empresário?

Adriano Ferreira

“Acredito muito na culpa do empresário, que não inova com medo de prejuízo”, afirma o gerente de A&B do Hibiscos, Maceió, Adriano Ferreira, que também não tira o peso da culpa do cliente e do chef.

Agora é aquela hora que o mundo tá falando e você tá com o olhar perdido num foco infinito pensando… eu! Eu tô aqui pensando aqui como devem sofrer steaks houses que apostam em cortes nobres voltando pra ‘dar mais uma passadinha’, aí o cliente faz a foto, mete no instagram… e a história do lugar começa a se desmanchar. Na Underdog, em SP, – claro que a realidade é outra – os caras já botam uma placa na entrada ‘não passamos do ponto’. Pisquei 3 vezes rápido, e voltei. Bora continuar.

Fábio Neves, do DomTom Universo Gastrô, entende que quem vende sempre tem mais culpa: “vender é, querendo ou não, uma forma de educar. Se eu vendo um produto ruim, tô ensinando a comer um produto ruim”.

Tadeu Almeida

Para o cozinheiro Tadeu Alemida é uma questão de cultura: “Não é só o sergipano, é o brasileiro. Aqui somos acostumados a “matar a fome” e não apreciar o prato. E claro, os chefs tem uma parcela de culpa nisso, porque tem pratos que necessitam de uma apresentação oral, para o cliente começar a enxergar o como algo que teve um certo estudo e carinho e não só pra matar a fome”.

Pedro Moraes, do Boulevard Food Park, acredita que o sergipano tem uma cultura forte. “Muitas vezes vão

Pedro Moraes

até deixa de experimentar algo novo pra comer aquilo que já sabe que vai lhe agradar… Ou seja, são meio “pé atrás” com novidades.”

Será, Pedro? Não duvidei da colocação dele e fui fazer uma enquete no stories do Instagram: ‘Que tipo de pessoa você é – geralmente – num restaurante: a que pede o de sempre ou a que quer provar um prato novo? 1240 responderam, e 60% pedem o de sempre. Pedro tem visão. No Boulevard, há uma tap house. É o empresário tomando pra si o dever de ensinar.

Gui Fontes

Gui Fontes, da Singela Cozinha, não acredita que o sergipano não saiba comer. “Comer o quê? A comida de outras culturas? O sergipano sabe apreciar uma boa buchada, mas pode dizer que um risoto está cru. Riosot não é da nossa cultura”

Pegando esse gancho, a Islândia tem a cultura de comer tubarão podre. É, tubarão.. só que deixa ele exposto até ficar podre, depois vai lá e come. Pergunto: a gente ia poder pegar colocar um casaco amarelo da CBF, chegar lá e dizer que o islandês não sabe comer? Acho que não, né. Bora continuar…

Para a sommelier Fernanda Pedute, tudo é uma evolução de paladar. “Você não começou comendo bife mal passado, sua mãe torrava. Depois você foi evoluindo”, mas acredita na tese (confirmada) de Pedro: “o cliente tem medo de provar.” Pra Fernanda, a culpa por essa frase circular é do cliente.

Ao contrário de Fernanda, o mineiro Antonio Freesz, mestre queijeiro, coloca a responsabilidade educacional sobre os ombros do produtor/empresário/chef: “Quando eu cheguei aqui eu não disse que sergipano não sabia comer queijo. Fiz um queijo novo e mostrei que dava pro sergipano comer um outro queijo, busquei educar sem falar mal dele. Gente, isso é que nem droga. Não se trata drogado dizendo que a coisa que dá prazer a ele faz mal. Cê tem que introduzir e conquistar.”

Antonio Freesz

Felipe e André, da cervejaria Uçá, são um exemplo do que o Antonio fala. Nenhum cliente chegou neles e disse ‘eu preciso de uma cerveja melhor’. Foi o contrário, eles fizeram, e hoje estão apresentando um novo produto para evolução de um paladar de quem só conhecia Brahma e Skol. Então, não é que o cliente não sabia beber, era o empresario que não parou pra trazer esse ensinamento. Concorda?

Sim, a gente passa o dedo na carapaça do caranguejo e come aquela laminha enquanto o francês come o que tem na carapaça do caramujo. Aprende a falar a língua do povo daqui, depois disso tenta ensinar a sua. Vai que flui, e cê gosta mais do nosso ‘bom da pé’, que a gente do seu ‘délicieux’.

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