Pesquisadora e doutoranda Sandra Santos argumenta que, caso o fechamento da escola se concretize, sociedade deve se mobilizar

Recentemente, pouco menos de um mês, o Cinform publicou uma reportagem em que revelava, com exclusividade, todo o processo que culminou com o cancelamento do convênio do polo do Instituto Federal de Sergipe (IFS) de Cristinápolis, sob comando direto do campus de São Cristóvão, com a Prefeitura de Cristinápolis, e o posterior fechamento do IFS naquele município.

A pesquisadora Sandra Santos. Foto: arquivo pessoal

A reportagem causou enorme repercussão local e em todo o Estado. E, mesmo com integrantes do próprio IFS – professores, diretores, assessores – relatando claramente o cancelamento do convênio e a provável futura política de cortes em nível nacional, o Ministério da Educação (MEC), com sede em Brasília, quando procurado pela reportagem do jornal, via assessoria de comunicação, por meio de uma lista com cinco perguntas, limitou-se a dizer, em duas linhas, que “não houve cortes e todo o orçamento disponível, aprovado pelo Congresso Nacional, foi liberado pelo MEC em 2018 para todos os institutos e todas as universidades”.

Mas o polo de Cristinápolis está sim com o convênio cancelado. Neste ano de 2019, caso o convênio municipal não seja renovado – e é o que tudo indica que aconteça – a antiga escola Agrícola da cidade, transformada em IFS desde 2008, que abarcava estudantes vindos de 11 municípios sergipanos e outras cinco cidades baianas, vai simplesmente fechar as portas para sempre e inviabilizar a formação futura de dezenas de jovens, deixar toda aquela região, já tão carente, desassistida de mais um recurso – o da formação profissional por meio de uma educação de qualidade.

UM POUCO DE HISTÓRIA

A antiga Escola Agrícola Ministra Leonor Barreto Franco, polo IFS em Cristinápolis, antes de se tornar um braço do Instituto Federal de Sergipe, da fundação até o ano de 2008, era uma escola que ofertou o ensino fundamental da 5ª à 8ª séries em tempo integral, em regime de semi-internato. A escola havia sido projetada, inicialmente, para acolher os alunos em regime de internato.

Com o intuito de iniciar o curso de Práticas Agrícolas (hoje curso Técnico em Agropecuária), o município conseguiu recursos via Ministério da Educação (MEC), através de projeto. Nesse projeto, a ênfase era demonstrar ao MEC a importância de se implantar uma escola de ensino agrícola com o regime de internato, pois o município de Cristinápolis, em Sergipe, era um município eminentemente agrícola e não dispunha de ensino voltado para a população que residia na zona rural.

O lugar da escola era o mais indicado para sediar a escola agrícola por suas condições de infraestrutura, especialmente por possuir, já instalada, a energia elétrica, bem como estar localizado próximo a um Assentamento da Reforma Agrária e sua população desenvolver práticas agrícolas que sobressaíam das demais localidades no município. Além disso, se localizava num lugar tranquilo, distante de barulhos e movimentação de veículos, o que contribuiria para o bom andamento do internato.

Desde a sua criação, sempre houve dificuldades na captação de recursos financeiros para a manutenção de pessoal, aquisição de implementos. Mais tarde, entre os anos 2000 e 2007, a Escola Agrícola Municipal Ministra Leonor Barreto Franco foi desativada como escola agrícola e, depois de sete anos desativada, servindo como centro de atendimento às crianças cadastradas no Peti, em 19 de março de 2008, a administração municipal assina o Pacto de Cooperação Nº 02/2012 entre Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Sergipe (IFS) e o município de Cristinápolis.

Esse pacto teve por objetivo promover a vinculação técnico-científico-pedagógica para a implantação de curso profissionalizante na Escola Agrícola Municipal Ministra Leonor Barreto Franco, o curso técnico em agropecuária em nível médio, reativando, deste modo, o ensino agrícola no município, o que possibilitou o funcionamento como polo do IFS, com a atenção voltada para a concretização do ideal de produtor e de produção, que estaria ao alcance de todos.

Para entender um pouco mais da história do IFS naquela região, o Cinform foi conversar com a professora Sandra Santos. Doutoranda em Educação pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), Sandra realizou o trabalho para a dissertação de mestrado dela, também em Educação, acerca da importância histórica do polo do IFS em Cristinápolis e toda a região que o circunda. Você acompanha agora essa entrevista:

Cinform: O que Sergipe e, principalmente Cristinápolis, perdem com o fechamento desse polo do IFS? Por que você escolheu esse polo do IFS como objeto de estudo para a sua pesquisa?

Professora Sandra Santos: Com o fechamento, Sergipe e Cristinápolis perdem muito. Então (para não fechar) seria o caso de uma mobilização da comunidade, reivindicar junto ao IFS. Realizei a pesquisa porque a minha experiência como professora dos anos iniciais do ensino fundamental e, posteriormente, na coordenação pedagógica de escolas do campo, proporcionou uma visão diferenciada da educação no meio rural. Como professora, passei a observar, com outro olhar, a realidade camponesa em suas múltiplas possibilidades de produção da vida.

E por considerar que uma escola que se situa no campo precisa atender às necessidades do povo do campo, me interessei em pesquisar o currículo de escolas do meio rural, no intuito de contribuir para pensar um currículo que atenda às necessidades dos sujeitos que vivem e trabalham no campo. Com esse objetivo, selecionei a Escola Agrícola Municipal Ministra Leonor Barreto Franco, Polo IFS, considerando a complexidade do processo educativo, bem como as questões políticas, culturais, pedagógicas e sociais que norteiam as ações pedagógicas desenvolvidas nessa instituição.

Você mora em Cristinápolis?

Sim, moro. E o fato de residir em Cristinápolis e o desejo de contribuir com a educação rural do campo no município também foram importantes para a escolha da escola em que desenvolvi a pesquisa.

Para desenvolver sua pesquisa, você conversou com quem? Que tipo de trabalho de campo você fez? Falou com alunos, professores, comunidade local?

Primeiro, apliquei questionários. Ao todo, foram 38 estudantes, que já estavam concluindo os cursos, que responderam esses questionários. Destes, 16 homens e 22 mulheres, que há três anos estudam no Curso Técnico em Agropecuária. Optei pelos alunos da 3ª série para ter a possibilidade de analisar uma sequência de três anos de duração do curso. E com o questionário respondido pude identificar quem são (eram) esses jovens e conhecer suas concepções sobre terra, ensino agrícola, campo/rural, meio ambiente, trabalho.

As perguntas foram elaboradas e aplicadas com o objetivo de coletar dados, e, a partir das respostas dos jovens, desenvolver uma análise de como questões relativas ao campo/rural são abordadas nos componentes curriculares trabalhados com os estudantes da Escola Agrícola Ministra Leonor Barreto Franco, polo IFS, nas disciplinas técnicas, especificamente.

Como se dá esse convênio, esse pacto municipal, formalizado entre o IFS e a cidade de Cristinápolis? Você poderia explicar?

A partir do Decreto Nº 83.935 a Escola Agrícola Municipal Ministra Leonor Barreto Franco passou a atuar como Escola Agrotécnica e a estar diretamente vinculada ao IFS, na condição de polo, em Cristinápolis, o que consolidou o estabelecimento de parceria para a oferta do Curso Técnico em Nível Médio, na forma integrada, em regime de semi-residência.

Os pactuantes obrigavam-se a executar os procedimentos administrativos e pedagógicos previstos no Pacto de Cooperação, além de fomentar experiências de pesquisa no âmbito do curso e, obrigatoriamente, em todo o material impresso deveria constar a logomarca das instituições envolvidas nesse Pacto, o que não ficou evidenciado nos documentos analisados na instituição. Constam do Pacto de Cooperação, cláusulas específicas do que compete ao IFS e o que compete ao Município de Cristinápolis, dos compromissos, dos recursos financeiros, do prazo do termo de convênio, da rescisão e do foro.

Qual a importância do ensino agrícola?

Sabe-se que o agronegócio é responsável por mais de 22% do PIB brasileiro e estudos do Ministério da Agricultura apontam um aumento da produtividade nas zonas rurais do país. Esse crescimento demanda uma grande quantidade de profissionais qualificados que possam atuar na produção, gestão, processamento e distribuição de produtos agropecuários. Com isso, podemos afirmar que é extremamente importante a manutenção deste Polo do IFS no município de Cristinápolis, posto que o mercado de trabalho para o profissional da agropecuária é favorável e promissor.

A característica do município, considerando que é uma região em que a agricultura familiar é um importante fator de sobrevivência das famílias camponesas, a presença de uma escola que possibilite a formação dos sujeitos para qualificar o trabalho agrícola é condição necessária para o desenvolvimento social.

E acerca da qualidade da educação que é oferecida no polo do IFS de Cristinápolis, sua pesquisa teve alguma conclusão?

A Escola Agrícola, ao ofertar o Curso Técnico em Agropecuária forma profissionais habilitados, dando a estes a credencial de atuar junto ao setor produtivo, em atividades de gestão, planejamento, projetos, produção animal, vegetal e agroindustrial, tendo como competência básica atender de forma sistemática às necessidades de organização e produção dos diversos segmentos da agricultura familiar e do agronegócio, para melhorar a qualidade e a sustentabilidade econômica, ambiental e social da região, possibilitando deste modo uma melhoria da qualidade de vida da população que vive e trabalha no campo.

Sandra Santos possui graduação em Pedagogia (UFS), é especialista em Gestão Educacional, Mestra em Educação (UFS) e atualmente cursa o Doutorado em Educação pela Universidade Federal de Sergipe. É professora do município de Cristinápolis desde 1998. Atuou na Coordenação da Educação do Campo no município e compõe a equipe Técnica Pedagógica da Secretaria Municipal de Educação.

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