Quem nunca esqueceu onde deixou as chaves da casa ou não lembrou a data de pagar uma conta? Apesar desses esquecimentos parecerem normais com o avanço da idade, é preciso ter bastante atenção se o problema não é algo mais grave, como o Mal de Alzheimer. Essa doença provoca deterioração das funções cognitivas, como memória, linguagem, funções executivas, planejamento, raciocínio, orientação e tempo espacial, gerando impactos profundos nas vidas de pacientes, cuidadores e familiares.

Os sintomas mais comuns são: esquecimento, principalmente para fatos recentes, como onde guardou objetos, não lembrar de compromissos, a senha do banco, repetir as conversas; alterações de linguagem, como estar conversando e de repente esquecer a palavra que iria falar; dificuldades em tomar decisões; e alterações no humor, como inquietude, irritabilidade, labilidade emocional e choro fácil.

“Esses sintomas ficam tão intensos que começam a fazer com que aquela pessoa tenha dificuldade de realizar atividades que sempre fez. Por exemplo: o indivíduo não consegue pegar um transporte ou fazer uma compra, resolver coisas no banco, tem dificuldade para cozinhar. A pessoa começa a ter problemas nas atividades do dia-a-dia”, explica a médica geriatra, Drª Juliana Silva Santana Pereira.

Drª Juliana Silva Santana Pereira, geriatra

A doença possui alguns estágios. Existe a fase pré-clínica, onde a pessoa não tem ainda um esquecimento, mas já apresenta um depósito da proteína no cérebro. Após essa fase, tem o declínio cognitivo subjetivo, onde já existe alguns esquecimentos muito discretos que não prejudicam as atividades do dia-a-dia. Posteriormente, tem o estágio de comprometimento cognitivo leve, onde já existe sintomas de esquecimento mais evidentes, com prejuízo mínimo nas atividades cotidianas.

“Secundariamente, tem a demência de Alzheimer, fase inicial, e posteriormente a fase moderada, onde os prejuízos já são bem maiores. Em seguida a fase 3 onde o indivíduo praticamente já perdeu quase todas as suas funções, fica acamado, incontinente, tem dificuldade de deglutição, não fala nada ou fala sons incompreensíveis”, comenta a médica.

 De acordo com a especialista, quanto maior for a idade, mais prevalente será a doença. Aos 60 anos existe uma chance de 1% da população ter a doença e aos 85 anos a chance é de 40%, mas tem pessoas com a doença de Alzheimer com menos de 60 anos de idade, é uma condição rara chamada de doença de Alzheimer de Início Precoce e, neste caso, o fator genético é preponderante e muito forte porque o indivíduo recebeu um gene autossômico dominante.

Existe um medicamento que freia a velocidade e a progressão da doença e os sintomas por um determinado tempo

 Diagnóstico

Para o diagnóstico do Mal de Alzheimer, é muito importante toda a história clínica, ou seja, a anamnese, identificando possíveis perdas cognitivas, caracterizando bem o esquecimento, entendendo sobre quedas, introdução ou retirada de algum medicamento, enfim colher bem a história clínica, fazer os testes neuropsicológicos ou avaliação neuropsicológica, que vão identificar os prejuízos e o quanto eles estão prejudicados, e um exame de imagem (tomografia ou a ressonância magnética nuclear).

“Esses exames servem, principalmente, para afastar a causa secundárias e avaliar lesões vasculares e também o tamanho do hipocampo, que está bem relacionado à memória episódica. Em caso de dúvidas, onde existe história familiar muito forte ou de início precoce, a gente faz a pesquisa dos biomarcadores ou no liquor ou com pet-scan amiloide e agora mais recentemente através de biomarcadores no sangue”, destaca Drª Juliana.

A difícil missão de lidar com o Alzheimer

 No ano de 2018, a autônoma Maria Aparecida da Silva Aragão, 66 anos, descobriu que tinha o Mal de Alzheimer. Segundo a nora, Luana Carvalho, a idosa já vinha apresentando comportamentos estranhos. “Ela acusava as pessoas de roubo, sempre foi uma pessoa difícil de lidar, econômica demais e com a doença isso foi se agravando, a ponto de não querer comprar comida para não gastar”, conta.

 Ela conta que a sogra desconfiava de todo mundo. Para a autônoma, as pessoas só queriam o mal e não aceitava ajuda. Quando veio o diagnóstico, ela não aceitou e após um irmão ir morar em outra cidade, ela teve depressão e o quadro só piorou. “Ela não sabia mais onde colocava o dinheiro, não se alimentava, foi quando decidiram leva-la para uma clínica. Lá, ela passou quase três anos. Veio a pandemia e as condições para mantê-la internada ficaram difíceis” conta Luana.

Maria Aparecida da Silva Aragão: descoberta da doença em 2018

“Em seguida, alugamos um cantinho próximo, para observá-la mais de perto, mas deixando-a ainda com algumas autonomias. Porém, o quadro começou a complicar novamente, pois as medicações eram bem difíceis dela aceitar. Começou a ter muitas limitações, já não tomava banho só, tinha alucinações bem frequentes e perda de memória avançada, a ponto de não reconhecer mais o próprio filho e se apaixonar por ele. Foi bem difícil, não lembrava mais onde estava, pedia para ir para casa e confundia o filho com o marido, que já estão separados a muito tempo”, comenta.

Falta de apoio

Luana Carvalho revela uma situação bastante lamentável: a autônoma não tem apoio familiar, apenas de um dos filhos. “Nossa maior dificuldade é não ter uma rede de apoio. Eu não consigo trabalhar e o tratamento pela rede pública é muito demorado. Tenho um exame neurológico marcado a cinco meses e o estado de saúde dela é avançado. Ela encontra-se acamada com dificuldades de locomoção, com enrijecimento dos membros, precisando de fisioterapia”, lamenta.

 Prevenção e tratamento

De acordo com Drª Juliana, é possível prevenir o Mal de Alzheimer. Em um estudo multicêntrico, chamado ‘Finger’, que envolveu vários países, foram identificados 12 fatores de riscos para o aparecimento da doença de Alzheimer. “Para que a gente possa prevenir, é importante atuar nos diversos fatores, ou seja, uma intervenção multimodal, realizando atividades físicas regulares, funcional – no mínimo 150 minutos por semana – estímulo cognitivo, alívio do estresse e da ansiedade”.

“Também é importante o tratamento correto e rápido da depressão, controle adequado dos fatores de riscos cardiovasculares, como hipertensão arterial, diabetes, dislipidemia, tribulação atrial, sensação do tabagismo, sensação do etilismo, evitar quedas e traumatismo crânio encefálico, tratar privação auditiva o quanto antes. Por isso, é importante a pessoa estar sendo acompanhada por um médico”, disse.

 A médica explica que existe um medicamento que melhora os sintomas da doença. Na prática, ele freia a velocidade e a progressão do Alzheimer e os sintomas por um determinado tempo, que são os anticolinesterásicos. “Associado ao medicamento, tem a terapia não medicamentosa com a reabilitação cognitiva, que significa socializar e fazer atividade física regular para manter o paciente funcional e ativo”, conclui.

 

 

 

 

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