Por Ermerson Porto* Historiador

Tradicionalmente, o povo de Maruim, no dia 05 de maio, comemora a emancipação política de sua cidade. Enquanto conceito, emancipação pressupõe independência e liberdade do ponto de vista político. Nesse sentido, várias povoações da Província de Sergipe Del Rei desligaram-se de suas vilas de origem ao final do século XIX. Nesse contexto, apresenta-se a cidade de Maruim (à época, Maroim), emancipada da Vila de Santo Amaro das Brotas e posteriormente elevada à categoria de cidade, em 05 de maio de 1854 pela Lei Provincial nº 374.

O povoamento da cidade originou-se numa região chamada Mombaça, onde se localizava o “Porto das Redes” e a “antiga Alfândega de Sergipe”, no encontro do Rio Sergipe com o Rio Ganhamoroba. A historiadora Lúcia Marques, especialista no tema, aponta que os moradores deixaram a localidade devido à grande quantidade de mosquitos transmissores de doenças.

Dessa forma, a povoação de Maruim passou a situa-se às margens do Rio Ganhamoroba, nas proximidades da capela erguida em louvor a São Vicente (1742) ainda no século XVIII, onde também estava localizado o antigo Engenho Maruim de Baixo, cujo proprietário era o Sr. Manoel Rodrigues de Figueiredo. O local era bem mais confortável e permitia melhores condições para a expansão do comércio e da agricultura.

Em meados de 1835, com a independência política e anos depois com a elevação à categoria de cidade, Maruim adquire grande importância econômica, proveniente de sua potencialidade açucareira. O significativo legado histórico e econômico à sociedade sergipana, deixado por Maruim, vai do Império à República Brasileira.

Com um solo produtivo e promissor ao cultivo da cana-de-açúcar (uma das maiores riquezas em meados do século XIX), a cidade chegou a possuir grandes engenhos, como o Engenho Pedras. Os portugueses predominavam, mas chegaram alemães, italianos, ingleses e suíços. Entretanto, é o coronel Gonçalo Rollemberg do Prado quem se destaca econômica e politicamente, detendo os maiores engenhos e governando a cidade por muito tempo.

Percebe-se que no final do século XIX, tamanha era a força econômica de Maruim que empresas e indústrias instaladas no município possuíam filiais em outros estados e países da Europa. Países como Alemanha, Inglaterra e França mantinham comércio regular com firmas localizadas no município, como a Casa Inglesa, Schramm e Cia, A. Fonseca, A Casa Cruz, Maynart e Irmãos e Soares & Prado.

Salienta-se que a empresa alemã “Schramm e Cia” tinha filiais em capitais como Recife, Salvador e Rio de Janeiro. O proprietário era Ernst Schramm, no qual a ocasião do falecimento de sua esposa, Adolphine, passou a responsabilidade para o sobrinho, Otto Schramm. Este último, chegou a ser nomeado cônsul.

A influência dessa família fez com que um consulado alemão fosse instalado em Maruim com cerca de trinta alemães, os quais fundaram uma colônia. Em 1850, a cidade ainda contava com consulados da Inglaterra, Noruega e Suécia. Todos eles influenciaram na vida econômica, política, social e cultural do município.

A necessidade constante em difundir a ideia de civilização, marcada pela instrução de um povo nas artes e na ciência, foi o pensamento que norteou a criação de instituições como o Gabinete Leitura, permitindo a circulação de novas ideias e valores e a difusão de obras literárias e artísticas, trazendo prosperidade moral e material para a sociedade. Desse modo, a civilização seria capaz de esclarecer o espírito e conceder o bem-estar.

O Gabinete de Leitura de Maruim teve como mentor o cônsul Otto Schramm. As cartas de sua tia Adolphine revelam que, em 1860, já possuía em sua residência um rico acervo que possivelmente, todo ou parcialmente, fora transferido para a biblioteca do Gabinete. Estamos tratando de um espaço de sociabilidade, com um vasto capital cultural, não só para Maruim, mas de referência para Sergipe; tanto quanto Província do Império, como em Estado da Federação, haja vista a importância desse espaço em ocasião dos acalorados debates liberais republicanos.

No aspecto religioso, os maruinenses sempre foram fervorosos na fé. Um povo de muitas crenças e variadas formas de buscar o transcendente. Tem-se registros da presença de religiões de matriz africana, como terreiros de candomblé e casas de umbanda desde o século XIX, fruto da forte e marcante presença negra no município, proveniente, sobretudo, do período escravista.

O maior símbolo da fé católica em Maruim é a Igreja Matriz erguida em homenagem ao Senhor Bom Jesus dos Passos, localizada na principal praça da cidade que lava o nome do Barão João Gomes de Melo – Barão de Maruim. A construção foi iniciada em 1848 e concluída em 1862, apresentando um estilo clássico barroco. A igreja possui uma única nave com dois altares laterais, dois púlpitos em madeira trabalhada e capela do Sagrado Coração de Jesus. Lá estão os restos mortais de pessoas ilustres como o Barão de Maruim, Pe. José Joaquim de Vasconcellos, Coronel José de Faro Rollemberg e o Governador Pedro Nogueira.

Além da Igreja Matriz, há várias capelas distribuídas nos bairros e povoados da cidade. A Igreja Matriz de Maruim tem um valor que excede o sagrado, consiste em um patrimônio material, que reflete a historiografia maruinense e é um bem tombado pelo Governo do Estado de Sergipe, pelo decreto 4.988 de 23 de abril de 1981. O monumento deve ser motivo de orgulho para toda a população.

Os protestantes por sua vez, desde o início do século XX estão presentes na cidade. Destacam-se duas igrejas de forte representação no cenário nacional e são referências no protestantismo. Trata-se, primeiramente, da Igreja Batista, que foi organizada em 1926 com 24 membros, fruto do honroso trabalho evangelístico da

Primeira Igreja Batista de Aracaju. O primeiro templo batista em Maruim estava localizado em frente à praça do Remanso.

Depois veio a Igreja Evangélica Assembleia de Deus, que iniciou seus trabalhos em 1950, com uma mulher negra, a Evangelista Florência Pereira ou simplesmente irmã Florência (como era carinhosamente conhecida). Sob a direção e orientação da Convenção Estadual da instituição, difundiu a mensagem pentecostal pela cidade. O primeiro templo da Assembleia de Deus em Maruim com sede própria estava situado à Rua Quintiliano da Fonseca.

Ainda na segunda metade do século XX, foi fundado no município um Centro Espírita denominado “Amélia Alves”, recebe o nome em homenagem a essa figura feminina de destaque que desenvolveu sua mediunidade em Maruim. Inaugurado em 19 de julho de 1978, funciona até os dias de hoje em um casarão do Período Imperial situado à rua Porto Velho, n 07, Bairro Centro.

As manifestações populares sempre tiveram grande significado para o povo dessa cidade. Começando o calendário pela procissão de Senhor dos Passos, que era comemorada, inicialmente, no primeiro dia do ano e hoje, por decisão paroquial, 21 de janeiro; a festa de Reis, no Bairro São José; e Bom Jesus dos Navegantes, no Bairro Lachez. O carnaval também agitava os maruinenses, sobretudo na década de 1940 e 1950 com os blocos Chic e Santa Cruz nos Micaremes, e também os penitentes na sexta-feira da Paixão.

O São João era um verdadeiro ritual a céu aberto: um mastro (qualquer tipo de árvore) era posto na direção da janela e a fogueira à frente da porta de casa. O milho assado na brasa ou cozido e a canjica não podiam faltar. A quadrilha junina e o Batalhão das Flores era uma grande festa, não tinha quem ficasse parado ao ver as belas moças dançarem pelas ruas de Maruim, guiadas pela porta estandarte e pelo pirrô (um típico mestre-sala). A Festa de Cruz de Bela acontece anualmente em novembro e constitui outra manifestação que marca o folclore e religiosidade popular no município.

Os cinco primeiros dias do mês de maio, todos os anos, é um período de grande satisfação para os maruinenses, que festejam neste período o aniversário da cidade. Maruim apresenta uma história que está viva no coração do seu povo, nas águas do Rio Ganhamoroba, na magnífica Igreja Matriz, em cada procissão de Senhor dos Passos, na festa de Cruz de Bela, no Parque Otto Schramm, na carne do sol com farinha de mandioca, depois da feira livre aos sábados ou mesmo na Festa do Mastro.

Em meio aos momentos distintos de glória e decadência desde o Império à República, infere-se que Maruim é uma cidade centenária, de notória importância histórica, cultural e econômica para Sergipe.

No próximo 5 de maio, o município completa 167 anos não só de emancipação política, mas de muita luta, resistência e histórias para contar. Evidentemente que não será uma comemoração como se costuma festejar, por conta do atual cenário pandêmico, contudo espera-se que seja um dia de alegria e homenagens a esta cidade significativa para história de Sergipe, assim como, caro leitor, que a sociedade e as autoridades competentes caminhem juntas, impelidos pelo desejo de construir uma cidade melhor e mais eficiente na preservação de suas raízes, rumo ao avanço sociocultural e econômico do povo maruinense.

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