Durante o período de intervenção judicial nos últimos cinco anos, o Hospital de Cirurgia (HC) em Sergipe, com quase 100 anos de história, passou por uma revolução surpreendente. Sob a liderança da enfermeira Márcia Guimarães desde novembro de 2018, a instituição hospitalar superou desafios financeiros, resgatou credibilidade e implementou melhorias significativas.
Inicialmente, o HC enfrentava dívidas de R$ 180 milhões, salários atrasados, 13º sem pagar há um ano, dívidas históricas com as concessionárias de energia e água, FGTS, e diversas outras irregularidades. Márcia Guimarães, ao assumir, enfatizou a importância de resgatar a confiança dos profissionais de saúde e fornecedores.

Além dos insumos insuficientes, a alimentação também não era adequada e não existia processos de trabalho. O período que antecedeu a intervenção foi marcado por uma desorganização generalizada. Com equipes médicas paralisadas, o Hospital de Cirurgia não produzia e não conseguia pagar os prestadores, isso resultou na suspensão dos procedimentos, aumento da fila de espera e mortes.
Com renegociações de dívidas e esforços para retomar a produção médica, o hospital gradualmente recuperou sua credibilidade. “Nós entramos em contato com os fornecedores e aos poucos a gente foi regularizando a situação e ganhando crédito. Isso tudo levou o colaborador e o corpo clínico, que gostava do HC e sabia da sua necessidade para o sistema de saúde, a nos dar um voto de confiança”, disse Márcia Guimarães.

Reestruturação e modernização
Esse trabalho inicial de valorização e resposta às demandas deu à nova equipe do HC confiabilidade. Com a pandemia, em 2020, o hospital recebeu a primeira doação do Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE), em forma de convênio, no valor de R$ 2,5 milhões, que serviu para a compra de equipamentos e montagem da primeira UTI Covid-19. A unidade também recebeu do grupo Lide, juntamente com a Fecomércio-SE, a doação de respiradores.

“Nós tínhamos um tomógrafo terceirizado, que estava parado, e em 2023 compramos um equipamento novo, mais moderno, através de uma emenda do então deputado federal Laércio Oliveira. O hospital, especializado em ortopedia, não tinha sequer um aparelho de Raio X fixo. Em 2019nós compramos um novo equipamento. O mesmo aconteceu com a ressonância magnética, que estava encaixotada, sem refrigeração adequada. Com ajuda dos parlamentares federais, uma nova ressonância foi adquirida”, explicou.

Uma área que recebeu investimentos foi a Central de Roupas. Foram promovidas adequações às normas sanitárias vigentes, contando com espaços administrativo; paramentação; sala de costura; dois depósitos de materiais de limpeza; duas salas de preparo de roupa; salão de processamento de área limpa (com arsenal de roupa limpa, calandra monorrolo e secadoras); e área de roupa a processar, com banheiros e vestiários masculino e feminino.

Para garantir a modernização, as máquinas lavadoras, que tinham mais de 30 anos, foram substituídas por modernas lavadoras extratoras. Também foi adquirida uma nova calandra (máquina de passar ferro) – um equipamento que a Central de Roupas do Cirurgia não possuía desde de 2016, quando a máquina antiga foi desfeita. “A centrífuga, que estava condenada pelo Ministério Público do Trabalho, existia uma ação para acabar sua utilização desde 2013, mas ela continuava funcionando”, comentou Márcia.

Mais dignidade
O resgate da dignidade do HC também passou pela reforma das enfermarias, que receberam pontos de diálise, climatização, cortinas hospitalares, poltronas para acompanhantes e televisão para todos os leitos. As Unidades de Tratamentos Intensivos (UTI´s) também receberam reforma, sendo uma delas com obras paralisadas desde 2016, assim como a Unidade de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon) que teve a recepção toda reformulada, oferecendo mais dignidade aos pacientes e profissionais de saúde.

“Tínhamos uma unidade extremamente quente, com os pacientes tendo que levar ventilador para ter o mínimo de conforto, e hoje temos um espaço climatizado. O ambulatório saiu do hospital, liberando espaço para mais leitos internos e se instalou em um novo prédio passando de 24 para 56 salas com melhoria do mobiliário e logística. O Centro Cirúrgico também foi recuperado”, disse Márcia Guimarães.

Recepção histórica
Um dos grandes feitos da intervenção judicial foi a reabertura da recepção histórica. Médicos que atendem no Hospital de Cirurgia há anos sonhavam com o retorno do funcionamento daquela área. “A gestão anterior abandonou a entrada histórica. Eles fecharam a porta com uma parede e isolaram a escada. Eles odiavam a história do hospital. Nós recuperamos tudo porque o entendimento de Márcia Guimarães era de que o paciente do SUS deveria ser tratado com dignidade”, disse o diretor técnico, Dr Rilton Morais.

“Na escada, o mármore é vermelho, então as pessoas são recebidas com um tapete vermelho, e uma imagem de Nossa Senhora, como era no passado. A sala de Dr Augusto Leite – o fundador do hospital – feita em 1931, estava fechada há 30 anos. O quadro do pintor Jordão estava abandonado e foi recuperado através de doação da família e de conselheiros. Hoje, temos uma sala do Conselho Deliberativo que respeita a história do HC”, disse o médico.

Números impressionantes
A reestruturação do HC pode ser medida pelos números. Atualmente, o hospital aparece como uma das mais importantes unidades públicas do Nordeste e do Brasil. Em comparação ao ano de 2018 – anterior à intervenção – houve um salto na realização de cirurgias e procedimentos ambulatoriais. Foram 914% a mais de exames ambulatoriais realizados e 334,5% a mais na produção hospitalar de alta complexidade. Em 2023, foram realizados 2.315 cateterismos.

Em comparação a 2018, foram realizadas 297% de cirurgias oncológicas a mais. Hoje, o HC lidera a produção hospitalar de alta complexidade do SUS, com 59% de tudo que é realizado em Sergipe, à frente do Hospital de Urgências (Huse) e Hospital Universitário. No ranking do Nordeste, está em 4º entre 81 hospitais especializados em cardiologia; 7º em neurocirurgia, 7º em cirurgias ortopédicas e 13º em oncológicas.

Dever cumprido?
Segundo Márcia Guimarães, ainda há muito o que fazer. A Justiça lhe concedeu mais um ano à frente da intervenção, mas ela garante que ainda tem mais 10 anos de trabalho dedicados à saúde, antes da aposentadoria. “O que eu espero de mim? Estar disponível para trabalhar! É isso que eu vislumbro daqui a um ano, dois anos ou dez anos, seja aqui ou em qualquer outro lugar”, frisou.

Márcia faz questão de agradecer a todos que a apoiaram até aqui. “Eu quero agradecer a bancada federal, estadual e agora a municipal, a Lide, Fecomércio-SE, Tribunal de Justiça, MPT e MPE. Todos esses órgãos deram apoio porque a gente mostrou que era necessário e que a gente poderia corresponder em termos de assistência. O que eles querem é a população seja bem assistida e nós estamos buscando isso sempre mais e melhor”, concluiu.

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