Em tempos de militância, invisibilidade ainda atinge população LGBT na maturidade

Assim como a expectativa de vida vem crescendo no Brasil, cresce também a ideia de que a maturidade é a melhor fase da vida. A noção de que, com o avançar dos anos, adquire-se serenidade e experiência é amplamente aceita e difundida. Mas, nessa tese, há algumas lacunas. Para quem é impedido de viver livremente a sua sexualidade e identidade, toda situação de preconceito é assimilada como se fosse a primeira vez. Nesse cenário, não há acúmulo de experiência.

Marcelo Lima afirma que a maturidade fortaleceu seu ativismo

Quem é homossexual, bissexual ou transgênero e já chegou à maturidade acaba sofrendo uma pressão dobrada. Isso por que, quando uma pessoa mais jovem se assume publicamente, é como se a carga negativa representada por sua sexualidade ou identidade de gênero fosse “abonada” em função da pouca idade. Na juventude, ser LGBT é visto como uma espécie de má fase. Para quem é mais velho, no entanto, ser LGBT é visto como um desvio de conduta.

Dessa maneira, inúmeros gays, lésbicas e bis acabam se resignando em relações hetero como forma de prestar contas à sociedade, enquanto vivem romances reais às escondidas. E essa ainda não é a pior face da LGBTfobia. Como o Brasil é um dos países que mais mata pessoas LGBT no mundo, envelhecer sendo homossexual ou trans é quase um luxo.

INVISIBILIDADE
Às vésperas de completar 50 anos, Marcelo Lima, com os cabelos já esbranquiçados, se considera realizado. Tendo assumido sua homossexualidade ainda na juventude, ele se tornou uma voz do movimento LGBT em Sergipe. Atualmente, Marcelo é presidente da Associação de Defesa Homossexual de Sergipe – Adhons.

“Enfrentei tempos em que não se falava em homossexualidade, em que não existiam fóruns de debate. Se é difícil hoje, nas décadas de 70 e 80 era pior ainda, sobretudo com a repressão da ditadura militar. Foi isso que me levou à luta nos movimentos”, afirma.

Marcelo lembra que o entretenimento para pessoas LGBT era restrito a determinados bares e boates. Por esse motivo, o ativista comemora algumas conquistas. “Ainda temos muitas dificuldades, mas temos uma abertura maior hoje em dia. Antes, éramos completamente invisíveis”, considera.

PRECONCEITO
Para Ângela, nome fictício de uma personagem real, a LGBTfobia atinge a todos da mesma forma, independentemente da idade. Aproximando-se dos 50 anos e namorando uma jovem abaixo dos 30, Ângela prefere não se identificar por medo das possíveis retaliações no local de trabalho. Segundo ela, Sergipe já viveu tempos piores em relação às discriminações.

“Aracaju já foi uma das cidades mais preconceituosas do Brasil. Hoje, já é possível respirar aqui. Muitos saíram do armário, mas, claro, preconceito sempre haverá, em qualquer idade. Não vejo a idade como motivação para o preconceito”, considera.

O professor de Moda e Modelagem Jean Araújo, de 50 anos, assumiu publicamente sua sexualidade aos 20. Ele afirma que, nos dias de hoje, os próprios homossexuais disseminam preconceitos. “Jovens gays olham para os gays mais velhos não como mais experientes, mas como ultrapassados”, resume.

POLÍTICAS PÚBLICAS

Linda Brasil: “conheço poucos LGBTs na maturidade”

A ativista transfeminista Linda Brasil, aos 44 anos, rompe as estatísticas de longevidade da população trans. No Brasil, a expectativa de vida dessas pessoas é de apenas 35 anos. Ela afirma que as pautas voltadas às pessoas LGBT na maturidade são quase inexistentes. “Perdi inúmeros amigos por conta das DSTs, da AIDS e da violência. Conheço poucas pessoas homossexuais mais velhas, e pessoas trans ainda menos”, diz.

Tathiane Araújo é presidente da Rede Nacional de Pessoas Trans do Brasil e da ONG aracajuana Astra, além de membro do Conselho Nacional de Combate à Discriminação LGBT. Segundo ela, as conferências nacionais e estaduais de direitos LGBT vem pautando questões relacionadas à maturidade, como a necessidade de abrigos. “As pessoas LGBT são excluídas de suas famílias, e, ao envelhecer, ficam sozinhas”, explica.

A presidente e conselheira destaca o caso específico das pessoas trans. A exclusão do mercado de trabalho faz com que 90% delas pague as contas à base da prostituição compulsória. Assim, a maturidade as prejudica na hora de obter seu meio de sustento.

 

SUPERAÇÃO

Jean Araújo: “gay pode estar em qualquer lugar”

Mesmo com as dificuldades e com a falta de visibilidade, muitas pessoas LGBT acreditam no poder da superação. É o caso de Jean, por exemplo. “Como qualquer outra pessoa, os gays podem vencer e estar em qualquer lugar”, opina.

De acordo com Marcelo, os anos trouxeram o fortalecimento de seu papel social. “A maturidade fez com que minha homossexualidade virasse foco de conscientização. Me considero um cidadão com dever cumprido e faço o que gosto, que é a educação permanente”, afirma.

Ângela também concorda, e fala sobre o lado bom de ter chegado à maturidade sendo LGBT. “Na maturidade há um ganho de respeito. Ela traz tranquilidade, menos paixões e mais calma. A parte boa é ter chegado até aqui feliz, com boas lembranças”, pontua.

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