Já parou para pensar, quais lembranças você guarda da sua infância?

Há algum tempo essas lembranças estão vindo coloridas e em cinemascope.

Lembro claramente da minha mãe Susete me arrumando para ir ao conservatório de música para a minha primeira aula. Um violão ‘Di Giorgio’ 1968 estudante, bem maior que eu.

Comecei a estudar em 1969 ainda no prédio da praça da Catedral, hoje Memorial do Tribunal de Justiça e logo depois nos mudamos para o novo prédio do Conservatório de Música de Sergipe, na esquina das ruas Santa Luzia e Boquim.

No primeiro dia de aula, no Sagrado Coração de Jesus, conheci Luiz Carlos Cavalcante Ribeiro, hoje Lula Ribeiro, lembro-me do teste de voz que fizemos com o Manezinho para cantar no Coral da escola. E o dia em que o professor João Argolo me colocou para tocar no palco do auditório Villa Lobos no conservatório. Lembranças boas e sempre ligada à música.

Uma das boas lembranças são da turma da rua Itabaiana com Maruim, Zezinho Queiroz, Guga Viana, Luciano, Carlinhos e Domingos o nosso Mingo Santana. A rua de Maruim era uma rua de artistas que ia da rua da Frente a caixa d’agua. Cesar Macieira, Joubert Morais, Marcos Prado, Mingo, Zia e Clarkson Santana, Zenobio Alfano, Irmão, Tonho Baixinho e tantos outros. Essa turma teve uma influência grande na formação de muitos de nós.

Entre eles o Mingo Santana que reencontro em 1979, na primeira Mostra de Compositores Sergipanos, realizado pela Coopermusica, movimento encabeçado pelos artistas consagrados da época, Alcides Melo, Irmão, Nery, Ailton Cardos, Valdefré, Claudio Miguel, Tonho Baixinho entre outros. Nós os “Novos” título dado por Irmão. Éramos, eu, Lula Ribeiro, Alex Pinheiro, Mary e Marlene Barreto e Mingo Santana.

Nessa época, ainda na ditadura militar, as nossas músicas algumas vezes eram censuradas, e o Mingo teve a sua primeira experiência nesse sentido com a censura da música “Manobras”.

Em 1981 no FSMPB realizado pela TV Sergipe, Mingo participa com a música “A Sementeira” em parceria com Beto Franco, a primeira tentativa de defesa do meio ambiente, uma proposta ousada de canção, com arranjos densos e lúdicos nas vozes, uma proposta inovadora e um marco na defesa do meio ambiente: ‘O bom vem de longe, ver de longe, verde longe… A semente da sementeira, o espinho dessa roseira. Manga banana, maracujá caju, é sempre bom plantar boas sementes e colher bons frutos.’

No início dos anos 80 uma nova fase se instalou nas realizações de shows e o grupo Entre Amigos realiza o show Entre Amigos em junho de 1981 no teatro Atheneu, começa uma mudança de paradigma na produção de shows, com pensamentos mais profissionais.

Nessa levada, Mingo realiza dois shows memoráveis. O primeiro, Lógica em 1981 e Navegando em 1982, formada por grandes músicos profissionais da Bahia, pois sua irmã Zia Santana já se destacava na música baiana nessa época. Mingo Santana lança seu primeiro trabalho em disco, um compacto com outro parceiro Oseas Lopes e a música escolhida é outra com o tema ecológico e local, Atalaia é um Jazz com misturas de baião e arranjo moderno cheio de swing:

“Sempre que ando pelas ruas desta cidade litoral, no céu as estrelas e a lua, o encontro de lá é aqui, onde a parte segura de tudo é viver. A riqueza da natureza, dentro da lama do mangue mora o caranguejo, fica na beira do mar doce banho de bica, entre o rio e o oceano existe uma ilha, da Barra dos Coqueiros até o Mosqueiro, Atalaia Nova, Atalaia Velha, Coroa do Meio, Atalaia.”

Lançou ainda mais dois discos o Som das Araras, em 1999, e Na Multidão, em 2003. No ano de 2014 lançou Eco-se, e mais alguns trabalhos ainda inéditos para o grande público.

Mingo Santana herda dos pais além do talento musical, já que sua mãe Vanda de Santana Souza era uma excelente pianista e o pai Clarkson Silva e Souza clarinetista, o tino comercial, seu pai ex-militar e gerente de vendas de uma multinacional, sua mãe vice tabeliã dona de cartório e da Papelaria Santana.

Então, ele assume muito cedo os negócios da família e rapidamente transforma a Papelaria no ponto de encontro dos artistas sergipanos. Todo final de tarde sempre tinha encontros de artista na papelaria, às vezes atrapalhando o trabalho da empresa. Dona Vanda era enérgica e não deixava barato, sobrava bronca para todos, eu pessoalmente gostava muito dela.

Um dia disse ao Mingo:

– Rapaz, eu vou coordenar o festival Novo Canto (festival de música estudantil muito importante nos anos 80), e não tem melhor lugar para as inscrições que aqui!

Mingo com sua visão de empresário e amante das artes transforma a Papelaria Santana na Casa do Artista e de lá para cá, as inscrições de todos os festivais são feitas na sua empresa.

Mingo é um lorde britânico, educado, contido, parceiro, ouvinte e cuidadoso e a Casa do Artista é o espaço de encontros, de apoio aos artistas, músicos, pintores, poetas, jornalistas, maestros. Como um grande vendedor ninguém sai de lá sem comprar nada, mas também leva um elogio, um conselho, uma informação e muitas orientações.

A música de Mingo é única na forma e diversa nos temas, e só por isso já gosto, ele tem preocupação com o meio ambiente e a espiritualidade. Compositor versátil que vai do forró ao frevo, passando por canções, jazz e o Rock. Voz grave e forte, mas adora um falsete (tom falso ou voz falsa. É uma experiência vocal no qual o cantor, de modo não natural, por isso falso, emite sons mais agudos do que o natural).

Somos parceiros em algumas canções, como Deserto da Foz, Rio de Lagrimas entre outras e sempre passo na Casa do Artista para conversarmos e claro, sempre tem uma história boa, e vejo a forma carinhosa e interessada em cada cliente artista que ele atende. Mingo é amigo, talentoso, parceiro e mesmo pensando diferente, temos o mesmo interesse. Valorizar, apoiar a música sergipana e a nossa cultura.