Por Shirley Vidal 

A primeira vez que ouvi falar de Robert Kegan foi quando li na capa do livro dele o seguinte título: Imunidade à Mudança. Como assim, gente, um sistema imunológico que nos deixa resistentes a mudar? Ele foi um dos motivos no meu ingresso ao curso de MBA em Psicologia Positiva este ano, na PUC.

Ao longo do doce novembro ‘provocação’ seria o nome certo para quem teve a experiência de ser aluna nas aulas do psicólogo americano. Sim, todos nós temos um sistema esquematizado que nos deixa resistentes às mudanças. Quando a gente sente que algo não está bom, “amarrado” ou até mesmo, nos prejudica, há indícios de que precisa de modificação.

E por que será tão difícil mudar? Prof. Robert diz que se quisermos fazer mudanças que realmente durem precisamos nos aprofundar. “Além de identificar comportamentos que sabotam os objetivos de mudança, precisa-se entender de onde vem estes comportamentos”, argumenta.

As promessas de fim de ano já chegaram à sua porta? Apenas força de vontade não bastará! A adesão a uma dieta alimentar, por exemplo, é um clássico. Sabia que mais de 90% das pessoas elevam o peso corporal ao desistirem dela? E o que ocorre? Não basta simplesmente mudar o comportamento. Precisa compreender quais comprometimentos ocultos nos leva a ações de auto sabotagem.

Dr. Kegan nos contou nas aulas que tem se dedicado a levar mais ação para o ambiente acadêmico e reflexão para o mercado de trabalho. Ele também compartilhou uma pesquisa que dá base aos seus estudos: cerca de 50% de pessoas acima dos 50 anos que têm doenças crônicas sentem dificuldades de cumprir a rotina de prescrição médica. O padrão de comportamentos sabotadores vai desde esquecer de tomar a medicação nos devidos horários até deixar faltar o remédio. Estas pessoas estão cientes dos riscos. Pelo caminho racional neurológico sabem que podem ter um agravamento de doença, risco de infarto, dentre outros males.

E ao serem questionadas por que continuamente insistem naquele comportamento, simplesmente respondem: “não sei”. E há honestidade na resposta. Realmente não entendem porque fazem aquilo consigo mesmo. Todos possuímos uma caixa de preocupações, um alarme. Mas como acionar este dispositivo? Compreendendo-nos quanto às crenças que nos alimentam e aprisionam. Particularmente, por desenvolver o marketing de diversos setores, trabalhamos com a questão da ‘imagem desejada’ de tal marca ou tal profissional. Ora, essa é a maneira que gostamos que os outros nos vejam e como esperamos nos ver também.

Tem gente que chega em verdadeiros precipícios para não violar esta imagem desejada, da qual se é subordinado(a). Na pesquisa do meu Professor ele conseguiu acessar os compromissos secretos daquele grupo de risco. Na verdade, quando essas pessoas deixam de tomar a medicação para preservar a saúde estão comprometidas em não serem classificadas (por elas mesmas) como idosas, velhinhos à mercê de pílulas diárias.

“Sem perceber, gasta-se uma alta energia para garantir que as coisas com as quais está se preocupando, não aconteçam”, contava na aula, Robert. David Rock, outro pesquisador, detalha um conjunto mediante esforço pela luta pela ‘imagem desejada’. Deseja-se status, certezas com graus de previsibilidade, autonomia e quem sabe, preservar relacionamentos, teoricamente, “valiosos”.

Esse sistema imunológico altamente capaz, ao mesmo tempo que nos protege, também pode nos atrasar em termos evolutivos. Jesus, meu Mestre eterno, diz que ““Trabalhai, não pela comida que perece, mas pela que subsiste para a vida eterna”. Sabedoria, autoconhecimento, solidariedade para si mesmo e para quem nos rodeia. O quanto temos dedicado nosso tempo a isso?

Kegan realmente me tirou do senso comum em suas magníficas aulas onde devíamos preencher nosso próprio mapa de imunidade. “Além dos pensamentos e sentimentos que temos, existem pensamentos e sentimentos que nos têm”, afirmava o Professor. E quais são estes pensamentos e sentimentos que estão nos conduzindo e dos quais temos menos consciência? É o homem sendo seu próprio lobo.

Na adolescência eu ouvia muita música de Gabriel, o Pensador. E agora lembrei especialmente de uma que dizia, “até quando você vai levando porrada? Muda que o medo é um modo de fazer censura”. Saudade, né minha filha, de música com letra que faz a gente refletir?!

Nossos monstros são nossos comprometimentos ocultos guardados a sete chaves em um baú escuro. É aí que entendemos que cada comportamento contraprodutivo tem mãe. E a maternidade é a mentalidade que desenvolvemos em séculos da raça humana com escassez, fome, medos de tempestades, doenças, heranças culturais, familiares, geográficas, etc.

Se a gente não se respeitasse, não nos protegeríamos tão bem. A questão é que uma imagem desejada pode ter um custo altíssimo. Pode custar inclusive uma vida mal vivida, cheia de subterfúgios de uma mente mimada, que deseja coisas como reconhecimento, sem se conhecer, ser amada, sem amar, ser presenteada, sem se doar. Quer facilidades e preservação de uma imagem que não tem botox, silicone, maquiagem ou estética que dê jeito ao longo do tempo.

Há quem prefira não mudar e viver também em meio ao dilema. O nome di (dois em grego)-lema, significa dois lemas. É um pé no freio e outro no acelerador. Duas proposições concorrentes na mente. É guerra que chama né? Que seja. Aí o sujeito chega no consultório médico e pergunta o que tomar para ser feliz. O doutor encara o paciente e diz: ‘decisões’.

Vou recorrer aqui a Freud para encerrar nosso desafio contínuo de equilibrar sistema imunológico X gestão da mudança. “Quando a dor de não estar vivendo for maior que o medo da mudança, a pessoa muda”.

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