Como alguns dos jovens tinham passagem pela polícia,retorna o debate:
está na hora de reduzir a maioridade penal ou não?
Por Anderson Christian e Julia Freitas
Durante o carnaval, a cidade de Itabaiana, no Agreste sergipano, registrou o 5º e 6º assassinato de jovens menores de 18 anos em menos de dois meses. Eduardo de Santana Neri, de 16 anos, foi alvejado por cinco disparos de arma de fogo na terça-feira de carnaval (12). O jovem foi levado para o Hospital Regional Dr. Pedro Garcia Moreno Filho, mas não resistiu aos ferimentos.
No dia seguinte, um dos amigos de Eduardo, Edson dos Santos Silva (17 anos), foi morto a tiros na saída do cemitério no bairro Campo Grande. De acordo com testemunhas, homens armados desceram de um carro de passeio de cor branca e atiraram contra o jovem, que morreu no local. Edson é irmão de Carlos Aécio dos Santos Silva. Conhecido como “Miau”, o jovem de 11 anos foi sequestrado e encontrado morto em julho do ano passado.
O assassinato de adolescentes já não é algo normal. E um número tão alto quanto este, é ainda mais alarmante. Todos os jovens, que possuem idades entre 14 e 17 anos, foram mortos por disparos de arma de fogo.
OUTROS CASOS
Wallace Júnior Alves da Silva, 14 anos: conhecido como “Walla”, o jovem morador do bairro da Torre foi o primeiro dos seis jovens assassinados na cidade neste ano. No dia 5 de janeiro, ele foi assassinado a tiros no bairro Eucalipto. Ele possuía passagens por atos infracionais, e poucos dias antes havia sido apreendido pela Polícia Militar com duas motocicletas com restrições de roubo.
Micael de Jesus, 17 anos, foi encontrado morto em um terreno baldio no bairro Coruja, na noite de 23 de janeiro. Ele foi alvejado por diversos tiros de arma de fogo e morreu no local.
Outro adolescente morto foi Gabriel Menezes de Santana, 15 anos. Na manhã do dia 4 de fevereiro, a Polícia Militar foi chamada na rodovia estadual João Paulo II (SE-170) após um corpo ter sido encontrado às margens da estrada. Era Gabriel, atingido por diversos disparos de arma de fogo. Segundo a PM, ele tinha envolvimento com pequenos delitos.
Já o caso de Jhonata Rezende Santos, 17 anos, chama atenção pelo fato de não ter envolvimento com nenhum tipo de delito ou passagem pela polícia. O jovem tinha acabado de chegar da Feira Livre quando recebeu um telefonema na manhã de 7 de fevereiro. Pouco depois foi encontrado morto no bairro Campo Grande.
PREOCUPAÇÃO
O delegado Élder Sanches, responsável pelo Departamento de Homicídios de Itabaiana, preferiu não dar informações sobre os casos por telefone à nossa equipe. Mas, segundo ele, as investigações estão sendo feitas, e que a divulgação neste momento poderia trazer algum prejuízo.
No entanto, o fato de que tantos jovens estejam sendo assassinados por arma de fogo nos bairros periféricos da cidade do Agreste sergipano preocupa. A seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Sergipe informou que para que eles possam começar a investigar esses casos, é necessário que haja uma denúncia à Comissão de Direitos Humanos ou à Comissão da Criança e do Adolescente.
Mas no que depender de familiares ouvidos pela reportagem, essas denúncias nunca serão apresentadas. O que mais se ouve é que ninguém quer levar o assunto adiante por medo de represálias.
LEI DO SILÊNCIO
“É melhor que ninguém aqui se manifeste. Esse pessoal é muito perigoso. Eles matam mesmo”, diz uma fonte que a reportagem buscou para facilitar o acesso aos familiares. Tanto ela como os parentes que foram ouvidos só falaram com uma condição: absoluto anonimato.
“Ele tava andando com uma turma da pesada já havia um bom tempo. E a gente, em casa, sentia que ele tava consumindo drogas também. Mas como ele era muito calado, não respondia nada quando a gente perguntava. Aí deu nisso”, disse a mãe de um dos assassinados.
Já um tio de uma das vítimas levanta uma questão que pode ser a linha de investigação que está sendo seguida pela polícia no inquérito mantido sob sigilo, ao menos até o momento.
“É uma briga de quadrilha. Tem uns bandidos que saem pegando esses meninos, oferecem tudo, se fingem de amigos, daí bota (sic) eles pra traficar, pra roubar. E o fim, infelizmente, é esse mesmo: a morte”. Esse mesmo tio diz que o sobrinho vivia se “gabando”. “Só falava em dinheiro, em arma, em mostrar quem manda, essas coisas. É uma pena, mas ele mesmo que procurou esse caminho”, vaticina.
REDUÇÃO DA MAIORIDADE
O fato de que dois dos jovens assassinados este ano em Itabaiana terem passagens pela polícia reacende o debate sobre a redução da maioridade penal. Para o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB, Robson Barros, a redução da maioridade penal não resolveria o problema da violência juvenil. Segundo ele, a principal causa dessa violência é a ausência de políticas públicas sociais, como lazer e cultura, incentivo à prática de esportes com destaque para a educação.
“A redução da maioridade penal é um erro gravíssimo. O caminho mais contundente é investir na educação de qualidade, boas políticas públicas sociais que cumpram seu objetivo de criar bons cidadãos para o futuro. Cabe ao poder público cumprir o que rege a nossa Constituição Federal, colocando em prática suas definições”, comenta.
Já o deputado federal André Moura (PSC), relator da comissão que analisou a redução da maioridade penal e autor do texto que foi aprovado na Câmara dos Deputados e segue para votação no Senado, pensa de maneira absolutamente contrária. “Então o que vai resolver é medida socioeducativa? Façam-me o favor. Elas já são aplicadas há tantos anos e nada de resolver. O problema só faz piorar. Na minha opinião, bandido tem que ser tratado como bandido, independentemente da idade”.
André Moura vai além. Na opinião dele, com a maioridade reduzida os bandidos adultos perderão essa “mão de obra” do crime. “Hoje é assim: eles “recrutam” esses jovens para o crime, através de promessas de ganhos fáceis, de poder. E se um deles é pego pela polícia, passa 90, 120 dias, cumprindo as medidas socioeducativas e é solto. E volta para o crime. É um círculo vicioso que ameaça a sociedade como um todo”, diz André.
Na sua análise, o parlamentar ainda pondera que a redução da maioridade penal pode ser a salvação desses mesmos jovens. “Além deles não terem mais a impunidade como um troféu para os crimes que cometam, quando eles estiverem presos, o Estado terá que dar garantia de vida a eles. Nesses casos que você reporta nessa matéria, pelos menos dois, que tiveram passagem pela polícia, se estivessem presos, poderiam ainda estar vivos”, finaliza André Moura.